Urbanização, Desenvolvimento Econômico e Gestão Fiscal para os Pequenos Municípios de Mato Grosso

 

A média da Taxa de Crescimento Geométrico nos municípios com população inferior a 20 mil habitantes em Mato Grosso, como já dito na “Parte 01”, é 0,87. Este crescimento urbano se reflete em uma série de desafios enfrentados pelas pequenas cidades, inseridas nos 15 (quinze) Consórcios Intermunicipais, para garantir seu desenvolvimento sustentável.

Se olharmos com a mesma visão estreita  que tem pautado inúmeras gestões, esquecendo o desenvolvimento social e ambiental e focarmos somente no desenvolvimento econômico, os pequenos municípios teriam  de atingir essa parcela do objetivo de crescimento econômico, entregando basicamente 4 (quatro) conjuntos de resultados: i) Alinhar as metas nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da aérea econômica; ii) Implementar reformas setoriais e temáticas baseadas em evidências e em consonância com a economia; iii) Capacitar indivíduos e instituições no planejamento de ações na área econômica; e iv) Melhorar a base de conhecimento para avanço da economia.

Segundo a Organização das Nações Unidas – ONU, o ODS 8: Promover o crescimento econômico sustentado, inclusivo e sustentável, emprego pleno e produtivo e trabalho decente para todos, nos diz que as “pequenas e médias empresas que se comprometem com o processamento industrial e com as indústrias manufatureiras são as mais decisivas para os primeiros estágios da industrialização e são geralmente as maiores geradoras de emprego. São responsáveis por 90% dos negócios no mundo e contabilizam entre 50 a 60% dos empregos”.

Se analisarmos em Mato Grosso a questão do emprego, podemos ver que a população desempregada, em 2015, atingiu a marca de 147.950 trabalhadores. O setor que mais apresentou desemprego foi na Agricultura, que apresentou menos 8.850 trabalhadores, em relação ao 4º trimestre de 2015. Já em relação ao mesmo período do ano anterior (1º trimestre de 2015) são menos 30.385 trabalhadores empregados nesse setor. Seguido da Indústria Geral, que registrou 4.949 trabalhadores a menos em relação ao último trimestre de 2015 e menos 23.440 na comparação com o 1º trimestre de 2015.

No Setor da Construção, em 2015, foram 12.008 empregos a menos em relação ao último trimestre de 2015 e com menos 26.358 em relação ao mesmo período de 2015. De lá para cá com a crise econômica e política que assola este país, a situação só piorou.

A tabela abaixo nos mostra a evolução da taxa de desemprego em Mato Grosso.Mas para atingirmos o desenvolvimento sustentável, precisamos notar que as áreas social e ambiental se inter-relacionam, se interatuam com a econômica e as decisões tomadas em uma delas, quaisquer delas, impactarão nas demais. Por isso, é impossível pensar em atingir os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável – ODS se agirmos em uma só direção.

Atualmente a sociedade não objetiva atingir unicamente metas de crescimento econômico, mas garantir políticas sociais e ambientais correlatas, com a perspectiva de que o “progresso” não se constitua um fardo com o consequente agravamento dos problemas urbanos e ambientais.

Os pequenos e emergentes municípios de Mato Grosso abarcam atualmente cerca de 900 mil habitantes. Quase um terço da população Mato-grossense produzem um grande núcleo de atração de empregos, de recursos humanos e de novos investimentos.

Esses pequenos municípios, vários deles sem terem o devido respaldo e acompanhamento da política estadual estão adquirindo cada vez maior importância econômica em relação à capital e às demais médias cidades do Estado. Hoje eles já respondem por 35% do PIB, ou seja, mais que 1/3 do PIB de Mato Grosso.

Como eles reúnem não só um importante e alto porcentual da população, mas também grande parte da atividade econômica, a sustentabilidade urbana é essencial para que se promova o desenvolvimento adequado para as futuras gerações. E para que o município ofereça à população as melhores condições de vida. As exigências dos cidadãos hoje se estendem às possibilidades inúmeras que cada cidade pode oferecer em termos de qualidade do ar e água, espaços públicos agradáveis de convivência (parques, praças, jardins, observatórios, entre outros…), cultura e lazer, além da prestação adequada dos serviços de educação, saúde, segurança e transporte, estes que normalmente são percebidos pela população.

Nossa preocupação se dá quando percebemos que os excelentes PIB municipais não encontram correspondência no IDH. Podemos citar como exemplos municípios com população inferior a 20 mil habitantes como Santo Antônio do Leste (cerca de 4.800 hab.) que possui um PIB relativamente alto de R$ 330 milhões, mas com um IDH baixíssimo de 0,655. Mas identificamos igualmente municípios com população acima de 20 mil habitantes, como Canarana (cerca de 21.000 hab.), com expressivo PIB = R$ 717 milhões (alto) e contrastante IDH = 0,693 (baixo).

Essa constatação comprova nossa afirmação que crescimento econômico não necessariamente corresponde à qualidade de vida e outros fatores precisam se agregar nessas ações para que os cidadãos sejam plenamente atendidos em suas necessidades. Alinhado a isso, com o crescimento urbano que ocorre em Mato Grosso que, com raríssimas exceções, historicamente aconteceu de forma desordenada, temos aí uma grande e difícil equação para resolver.

As nossas cidades na sua grande maioria, nesses pequenos municípios, crescem de maneira desarticulada, com baixa densidade demográfica e alta segmentação. A falta de planejamento – como já dito – ou de condições de executá-lo adequadamente, continua paulatinamente a gerar exclusão social e efeitos negativos dos quais podemos citar: o surgimento de locais desprovidos de infraestrutura onde a população se instala em assentamentos precários, muitas vezes em áreas de risco ou de preservação ambiental, por falta de uma política regional adequada de habitação. E essa iniciativa de sobrevivência, que ocorrem por falta das respectivas políticas de habitação, saneamento e transportes, geralmente prejudica a população como um todo, quando segmentos diversos ocupam beiras de córregos, áreas de mananciais ou áreas de preservação.

Quando a cidade se dá conta o processo de instalação dessas pessoas é irreversível, tão difícil e oneroso que só é possível computar os danos sem conseguir resolvê-los. Cito como exemplo a ocupação das margens das reservas Billings em São Paulo, que compromete a qualidade do abastecimento de agua da cidade.

Em Mato Grosso podemos citar, como exemplo, o esgoto “in-natura” lançado pelos municípios ribeirinhos da Região do Araguaia, denominada “Vale dos Esquecidos”, no Rio Araguaia. Este (esgoto “in-natura”) em um futuro bem próximo irá comprometer significativamente o turismo na região e a qualidade do abastecimento de água das cidades a jusante. Também podemos mencionar a completa ou parcial ausência de serviços urbanos e sociais em níveis adequados para atender a população; a falta e os problemas de segurança pública; o sucateamento ou a falta de hospitais regionais por falta de gestão ou de repasses constitucionais.

Diferentemente das médias e grandes cidades, a pobreza muitas vezes não se encontra na periferia, mas no próprio centro das pequenas cidades, o que evidencia e acaba por ser uma das formas de alimentar um ciclo vicioso e maléfico da desigualdade social.

Arriscaria dizer que as soluções, para os municípios com população inferior a 20 mil habitantes no Mato Grosso, que compõem os Consórcios Intermunicipais, requerem uma visão ampliada global, mas sobretudo regional do desenvolvimento urbano, visando atender aos diversos objetivos que impõem uma estratégia de desenvolvimento sustentável – contemporâneo e com metas futuras bem estabelecidas, balizadas na gestão e planejamento, com bons indicadores de acompanhamento. Contudo, as cidades desses pequenos municípios de Mato Grosso enfrentam o grande desafio de gerar seus recursos para satisfazer as demandas dos cidadãos por bens públicos.

Se Analisarmos o índice de Gestão Fiscal, ou seja, as formas como os tributos pagos pela sociedade são administrados pelas prefeituras, relativo a Receita Própria, se constata que 90% desses pequenos municípios estão com suas gestões fiscais críticas com um índice médio de 0,2506 (índice este que varia de 0 a 1, onde 1,0000 é Gestão de Excelência).

A solidez fiscal dos governos municipais em Mato Grosso é uma condição necessária para a sustentabilidade urbana e consequentemente a qualidade de vida nas cidades.

Os municípios são os responsáveis pela prestação de grande parte dos serviços urbanos locais. No entanto, grande parte deles depende de transferências da União e do Estado, traduzindo-se em uma excessiva dependência das transferências advindas (desequilíbrios verticais) e diferenças entre as próprias cidades do mesmo Consórcio Intermunicipal com municípios com maior base econômica e municípios com menor base econômica (desequilíbrios horizontais). E mesmo que utilizem de forma adequada suas próprias fontes de renda, necessitam e muito de recursos para investimentos.

Dos 15 (quinze) Consórcios Intermunicipais, os Consórcios do Alto do Teles Pires e o da Região Sul possuem grandes assimetrias na capacidade de gestão dos recursos oriundos da Receita Própria. Os demais 13 Consórcios a gestão fiscal municipal, em quase todos os municípios, é crítica ou com dificuldades, com raríssimas exceções.

Na maioria das circunstâncias, a base tributária é precária e explorada muitas vezes de forma inapropriada, não colaborando com a geração dos seus recursos próprios necessários para atender, de forma adequada, às demandas impostas pela infraestrutura necessária para a urbanização e melhoria da qualidade de vida dos habitantes.

Os problemas gerados pela instabilidade na gestão fiscal estão se agravando a cada ano, em especial nas áreas diretamente ligadas ao saneamento básico (drenagem de águas pluviais, coleta e tratamento de resíduos sólidos, esgotamento sanitário e proteção das fontes hídricas que abastecem as cidades), que reflete diretamente na área da Saúde Pública por uma crescente pressão a demanda por mais recursos para construção de novos postos de saúde e hospitais regionais.

Tudo isso está ligado à forma de gerir a cidade: a Gestão fiscal, a governabilidade e a transparência, impactando diretamente em deficiências nos serviços prestados aos cidadãos.

Podemos então observar que os problemas de gestão das administrações municipais, desses pequenos municípios que possuem população inferior a 20 mil habitantes, são generalizados e incluem a falha dos sistemas financeiros e administrativos internos (capacitação dos gestores locais), a ausência de controles efetivos sobre os serviços públicos (falta de indicadores e participação popular efetiva) e a escassa capacidade de planejamento.

Enfim, para resumir, o que ocorre em matéria de Gestão podemos dizer que existe hoje uma governabilidade local caracterizada por desequilíbrios fiscais verticais, baixa capacidade institucional e praticamente nenhum controle social, que resultam em um desenvolvimento “insustentável” das cidades, derivando em grande número de assentamentos irregulares, habitação sem qualidade, insegurança pública, informalidade social e econômica, falta de trabalho, emprego e geração de renda, assim como a segmentação no acesso a serviços básico de infraestrutura urbana e na precariedade da saúde pública, com raras exceções.

Um possível caminho poderá estar na efetivação de ações nos 15 (quinze) Consórcios Intermunicipais com a implantação de políticas de planejamento regional, à aplicação descentralizada de funções regulatórias via consórcios intermunicipais com a realização de serviços de interesse comum importantes para a sustentabilidade urbana e ambiental da região, e acima de tudo com a participação efetiva da sociedade na tomada de decisões e acompanhamento efetivo da gestão, ou seja, transparência e controle social.

Na “Parte 03” escreveremos sobre “Plano Diretor ou Plano de Ação? Quais são as cidades onde queremos viver? ”

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About Eduardo Cairo Chiletto

Arquiteto e Urbanista - Presidente da Academia de Arquitetura e Urbanismo-MT. Coordenador Nacional de Projetos da PAGE - Brasil (2018 - 2023). Secretário de Estado de Cidades-MT (2015-2016)... Conselheiro e Vice-presidente do CAU/MT - Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Mato Grosso (2015-2017)
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