Cuiabá e suas “Ilhas de Calor”: aonde foram nossas árvores?

Prefeitura corta árvores

A ilha de calor urbana constitui um dos mais expressivos exemplos das modificações climáticas produzidas pelo homem. Assim, o Sistema Clima Urbano é o resultado das interações entre atividades humanas urbanas e as características da atmosfera local, dentro de um contexto regional.

A cidade é o exemplo mais significativo das mudanças radicais impostas pelas atividades humanas. A atmosfera da cidade torna-se mais aquecida, tanto devido à presença de material particulado (poeira, fuligem), liberação de gases (CO2, CO e outros), provenientes de veículos e indústrias, pela desarborização, como pela liberação de calor armazenado no tecido urbano.

Assim, a cidade gera um clima próprio, fruto da interferência dos atributos do tecido urbano na atmosfera tais como: materiais empregados nas construções, geometria e rugosidade da cidade, emissão de aerossóis, asfaltamento das ruas e avenidas sem a devida arborização, cimentação das praças e quintais, além de outros.

A intensidade da urbanização, em termos de espaço físico construído, provoca diferenças nas propriedades térmicas, hidrológicas e aerodinâmicas entre superfícies urbanizadas e vegetadas, e entre áreas centrais e suburbanas, resultando em maior aquecimento no centro das cidades em relação aos ambientes suburbanos e rurais. Este fenômeno é conhecido como ilha de calor e constitui-se em um dos efeitos mais evidentes da influência das atividades humanas nas condições da atmosfera local.

Os primeiros estudos sobre as variações térmicas e de umidade em áreas urbanizadas de Cuiabá foram realizados por Maitelli et al[1], em 1990. E a configuração da ilha de calor urbana e a sua intensidade foi evidenciada, notadamente, no período noturno, em condições de estabilidade do ar, sem a ocorrência de chuvas, quando o calor armazenado no tecido urbano foi liberado para a atmosfera.

Entretanto, em Cuiabá, mesmo com medidas com ocorrência de chuva foi possível observar que o distrito comercial era mais aquecido do que o seu entorno, confirmando a influência do uso do solo nu e cru sem a cobertura de árvores, nas condições térmicas da cidade.

As variações das taxas de umidade relativa eram inversamente proporcionais à temperatura, isto é, o ar era em média 10% mais seco nas áreas centrais da cidade em relação às áreas arborizadas e/ou suburbanas.

Pois bem…. Estudos recentes realizados por pesquisadores doutores da USP – Universidade de São Paulo – comprovaram que a temperatura do asfalto sob insolação pode atingir 600C, enquanto o mesmo asfalto, mas agora sob a proteção da copa de uma árvore atinge cerca de 350C.

É uma diferença alarmante….

Vários estudos realizados, por exemplo, pela UFMT – pelos Programas de Pós-Graduação em: Ciências Florestais e Ambientais; Geografia, Arquitetura e Urbanismo, Biologia e outros – comprovam que a arborização urbana é um dos fatores que está relacionado à melhor qualidade de vida da população.

As instituições acadêmicas de Mato Grosso (UFMT, UNEMAT, IFET, e Universidades Privadas) com seu potencial de produção científica, podem tornar-se espaços de projetos florísticos que considerem as características peculiares de cada espécie e utilizá-las para a implantação da arborização com qualidade superior a que hoje possuímos em nossas ruas, parques, jardins e quintais.

A maneira que utilizamos “o conhecimento específico das espécies arbóreas (uso, adaptabilidade, crescimento, porte) e do ambiente a ser implantado são a base para o planejamento da arborização urbana, com intuito de aproveitar melhor as características de cada indivíduo, reduzir os custos de manutenção e minimizar possíveis conflitos entre as árvores e os elementos urbanos”[2] (grifo nosso).

Acredito que uma parceria entre Prefeitura, Instituições Acadêmicas, CAU/MT – Conselho de Arquitetura e Urbanismo e CREA/MT em uma campanha: “Plante e cuide de sua árvore”, como sugeriu minha grande amiga Doutora em Ciências Biológicas Ermelinda De Lamonica Freire, resultaria em grande benefício socioambiental com custos econômicos ínfimos se comparados aos benefícios para a saúde física e mental do ser humano.

Vale lembrar que as ruas arborizadas, além de bonitas e agradáveis, são comprovadamente benéficas e diminuem em até 250C a temperatura que o asfalto libera, além de que as árvores ajudam a diminuir a poluição sonora, porque servem como bloqueio natural às ondas de som.

Segundo a OMS – Organização Mundial de Saúde – a poluição sonora é hoje a terceira principal causa de poluição do Mundo, e reconheceu que o ruído pode perturbar o trabalho, o descanso, o sono e a comunicação nos seres humanos, pode prejudicar a audição e causar ou provocar reações psicológicas e fisiológicas.

http://hostel7.com.br/goiania-e-a-segunda-cidade-mais-arborizada-do-mundo/

Goiânia é a segunda cidade mais arborizada do mundo.

O que fazer? Plantar árvores…. Um local com somente 30 metros de largura de arborização reduz o ruído de 5 a 8 decibéis. Esta redução é igual a uma queda de 50% no barulho ouvido por uma pessoa.

Além disso, o “ruído” do farfalhar dos galhos, os odores refrescantes, a florada e frutas, o abrigo de pássaros e seus cantos, e a melhoria da qualidade do ar associado ao plantio de árvores melhoram a qualidade de vida física, mental e espiritual do ser humano.

Ela é a verdadeira Ecobarreira, ou seja, é uma cerca viva acústica que oferece uma proteção efetiva contra poluição sonora. Além de muito eficiente para controlar a poluição atmosférica, à medida que retém o material particulado e nanoparticulado da atmosfera. A qualidade do ar é hoje um dos principais problemas de saúde em centros urbanos.

Como cidadão Mato-grossense fico impressionado com os moradores de Cuiabá quando os vejo cortando, em seus quintais, suas árvores ou não se importando em plantá-las em suas calçadas, muitas vezes porque pensam que “elas sujam as calçadas e rompem o concreto dos pavimentos”.

Fico mais surpreso ainda quando percebo que em uma cidade extremamente quente como Cuiabá, a fiação elétrica/lógica/telefonia possui supremacia sobre a arborização que é responsável pela diminuição da temperatura e por nossa saúde física, mental e espiritual.

E para concluir este breve colóquio vou aqui neste instante reproduzir a fala de amigos que admiro muito e faço de suas palavras, as minhas:

“Uma pena que os gestores municipais estão muito aquém do que deveriam ser! São descompromissados com a causa pública e com a cidade e seus munícipes. Nem sabem a que vieram.”

“Plante e cuide de sua árvore”!!!!

Eduardo Cairo Chiletto
Coordenador na PAGE-MT – The Partnership for Action on Green Economy

 

[1] MAITELLI, G.T., ZAMPARONI, C.A.G.P., E LOMBARDO, M. A., Ilha de calor em Cuiabá/MT: uma abordagem de clima urbano, Anais do 3º Encontro Nacional de estudos sobre o Meio Ambiente, V.1, Comunicações, Londrina/PR, 1991,561-571.

[2] Poliane Pierra Maroto Patricio, Florística e Diagnóstico da Arborização da Universidade Federal de Mato Grosso, Campus Cuiabá.

 

 

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About Eduardo Cairo Chiletto

Arquiteto e Urbanista - Presidente da Academia de Arquitetura e Urbanismo-MT. Coordenador Nacional de Projetos da PAGE - Brasil (2018 - 2023). Secretário de Estado de Cidades-MT (2015-2016)... Conselheiro e Vice-presidente do CAU/MT - Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Mato Grosso (2015-2017)
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7 Responses to Cuiabá e suas “Ilhas de Calor”: aonde foram nossas árvores?

  1. Avatar de Ermelinda Freire Ermelinda Freire disse:

    Muito bem colocado o tema, caro Edu! Sonho em ver retornar o verde à minha Cuiabá. Os gestores da cidade, e seus assessores, deveriam aprender um pouco mais sobre arborização e não gastar o dinheiro público, plantando palmeiras que são inadequadas. Tomara que acordem ao ler seu texto. Parabéns pela sua clareza!

    • Foi inspirado em você Ermê…. Nas nossas conversas e no seu compromisso com nossa Cidade.
      Encaminhei o texto para alguns deputados, vice-governador e presidente da AMM…. Quem sabe um deles resolve se comprometer com a idéia, né?
      Muito obrigado pelo carinho de sempre!

  2. Avatar de Benedito Carlos de Jesus Benedito Carlos de Jesus disse:

    O artigo torna-se um ponto de referência e reflexão fundamental na disciplina que estou ministrando na UAB UFMT, Introdução a Física ambiental, pois dele extraio a visão de um profissional que busca a qualidade de vida.
    Ressalto a importância do tema, porque através dele posso contextualizar aos meus alunos uma amostra de como o saber científico, pode servir de mote para ações concretas de sustentabilidade, no sentido de prevenção contra a poluição ambiental, sonora e as ilhas de calor. E mais, o artigo da várias linhas de análise, para que cada aluno, cidadão e poder público municipal e estadual, revejam suas ações na cidade, de modo a garantir a qualidade de vida de cada um de nós!
    Obrigado pela visão e observação sobre um probleminha real mas que exige de cada um nova postura!

  3. Avatar de Marcos Souza de Jesus Marcos Souza de Jesus disse:

    Bom dia, sou o filho do professor Benedito e acredito que o tema foi muito bem abordado. Eu, enquanto estudante de engenharia civil, vejo como um ponto crucial a participação das instituições de ensino, pois são nelas que se desenvolvem muitas das pesquisas com os futuros profissionais que ingressarão no mercado. Porém, penso que deve atender as necessidades da região, como foi descrito no artigo, deve-se entender a dinâmica da cidade e analisar onde é melhor intervir e como. Além disso, há o aspecto do conhecimento sobre a burocracia envolvida, esse que não se aprende na universidade e, mesmo assim, é essencial para alcançar um nível de excelência profissional. Sou aluno de primeiro ano, mas não acho que essas problemáticas devam ser remediadas, desde o início é bom começar a fazer as conexões e tentar ver um panorama mais geral, ainda mais numa cidade como Cuiabá, muito quente, parece que já está na hora de se moldar uma ação efetiva, tornar a cidade mais respirável. Agora uma vivência minha: sempre que passo pelo “bosque” do lado do Centro Cultural da UFMT e, ao lado está uma avenida, sinto uma grande diferença e penso como os ambientes podem ser muito diferentes, tudo por conta de uma boa arborização.

    • Excelente abordagem Marcos…. Principalmente se levarmos em conta, já que você é estudante de Engenharia, a importância do Engenheiro de Tráfego.
      Pouquíssimas pessoas se preocupam ou já ouviram falar desta importante área da Engenharia…. Mas conhecer o papel da engenharia de tráfego nos auxilia a entender como se formam as normas e orientações dadas pela legislação que devemos seguir.
      E através dessas normas e Leis, podemos tornar o leito carroçavel mais aprazível.
      Já que você gostou do artigo, aconselho a se aprofundar na área “Engenharia de Tráfego”… Quem sabe um dia possamos ter mobilidade e acessibilidade urbana com qualidade de vida para os cidadãos.
      E por gentileza, mande um grande abraço para o seu pai. 🙂

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