Saudade: tessituras entre passado, presente e futuro

Que tipo de futuro queremos construir e que tipo de sociedade queremos formar?

Dia 31 de janeiro é o “Dia da Saudade”. Saudade de que? Do que passou? Mas nada adianta viver do passado e comparar épocas, apesar da grande maioria da população ter uma inclinação natural para enaltecer a nostalgia e muitas vezes o pessimismo, levando a crer e pensar que viver antigamente era melhor em muitos aspectos que viver o hoje.

No meu ponto de vista, isso é um grande equívoco!

Até consigo entender os pessimistas quando faço a seguinte indagação: de que forma podemos promover uma sociedade justa, ética, democrática, inclusiva e solidária se os políticos eleitos atualmente, em sua grande maioria, só se preocupam em se perpetuar no poder com seus bolsos cheios de dinheiro, enquanto a grande maioria da população vive na miséria sem saúde e saneamento básico, assim como sem segurança pública?

Segundo relatório da ONU-Habitat de 2012, duas em cada três pessoas que vivem nas cidades latino-americanas estão em condições de pobreza. O “abandono” da população rural e das populações vulneráveis nos obrigam a refletir sobre o conceito de sustentabilidade no desenvolvimento municipal, mas principalmente na política e na postura de boa parte dos políticos e seus assessores, que são os gestores desse caos social em que vivemos.

Essa política danosa que existe em grande parte nos municípios e a falta de planejamento estratégico gera a exclusão social e muitos outros efeitos negativos na sociedade, dos quais podemos citar: o surgimento de locais desprovidos de infraestrutura onde a população se instala em assentamentos precários, muitas vezes em áreas de risco ou de preservação ambiental pela falta de uma política de regularização fundiária e de habitação social. O que esperar da classe política?

Neste contexto, interessante é a abordagem feita na música “Everyday Life” (Vida Cotidiana) do grupo Coldplay: “O que vamos fazer no mundo? Veja o que todas as pessoas estão passando. Que tipo de mundo você quer que seja? Eu sou o futuro ou a história?”. A pandemia da COVID-19 mostrou de forma clara e límpida a incompetênciade grande parte dos gestores públicos e da estrutura política em que vivermos. Fez muitas pessoas que eram o futuro, ficarem na história para a tristeza de milhares de famílias e da sociedade, com perdas inestimáveis para avós, pais, filhos, netos e bisnetos… Aí sim, deixaram muitas saudades! A pandemia nos mostrou, entre outras coisas, a importância da solidariedade e do compromisso com a saúde pública.

Por outro lado, alguns teóricos ainda escrevem que “… as novas gerações começam a acreditar no mais ameaçador perigo para a convivência gregária e a solidariedade: o individualismo exacerbado”. Digo que estão equivocados e dou exemplo: meus três filhos são infinitamente melhores que eu em todos os aspectos, sobretudo no social e emocional. São cidadãos conscientes que defendem a verdade e desejam um mundo melhor e sustentável. Acreditam que juntos e unidos podemos mudar.

Também não posso deixar de citar que em 2012, o documento final da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável Rio + 20 (“O futuro que queremos”), reconheceu a importância do desenvolvimento sustentável e a erradicação da pobreza, tendo por objetivo melhorar o bem-estar humano e igualdade social, ao mesmo tempo em que se reduziria significativamente os riscos ambientais e os desequilíbrios ecológicos.

Ignacy Sanchs já em 1985 nos mostrou, em seus princípios, que quando focamos nosso compromisso político, ético e moral nas pessoas, a temática da sustentabilidade adquire uma perspectiva, um prisma e uma ótica única, pois passamos a agregar dois valores importantíssimos a todo esse processo, que se chamam respectivamente história e cultura.

História… Saudades do passado… Nostalgia? Existe um ditado popular muito interessante: “Quem vive de passado é museu”. Mas se está no museu é porque já fez história, não é? Mas a história se iniciou através de um processo… E o processo é exatamente o que fazemos hoje! Quem respeita a vida e vive com amor deixa indeléveis marcas de esperança e alegria no coração e na memória dos outros e faz história ao consolidar uma ação positiva. Sem ela o caminho é mais pobreza, mais desigualdade e a uma perpetuação de um ciclo vicioso de uma política lesiva e sem compromisso com a sociedade.

Como disse o líder espiritual do budismo tibetano, Dalai Lama: “Só existem dois dias no ano que nada pode ser feito. Um se chama ontem e o outro se chama amanhã, portanto hoje é o dia certo para amar, acreditar, fazer e principalmente viver”.

E na sabedoria popular: o passado é lição para refletir e não para repetir… inteligente é aquele que sabe aonde quer ir, e mais inteligente ainda é aquele que sabe onde não deve voltar”. Então, vamos espalhar juntos o vírus da solidariedade e do amor, e fazermos todos o hoje, o agora e a nossa história para sermos exemplos e deixarmos saudades…

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About Eduardo Cairo Chiletto

Arquiteto e Urbanista - Presidente da Academia de Arquitetura e Urbanismo-MT. Coordenador Nacional de Projetos da PAGE - Brasil (2018 - 2023). Secretário de Estado de Cidades-MT (2015-2016)... Conselheiro e Vice-presidente do CAU/MT - Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Mato Grosso (2015-2017)
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